Saco de Ossos

Quando o luto encontra o sobrenatural à beira do lago…

Publicado no Brasil pela Suma de Letras, com 616 páginas de pura inquietação psicológica, Saco de Ossos é Stephen King fazendo aquilo que poucos escritores conseguem: misturar drama, romance e terror como se estivesse apenas brincando com palavras — e ainda te deixar chorando e apavorado ao mesmo tempo. Se você acha que King é só monstros e palhaços assassinos, prepare-se… aqui, o maior fantasma é a saudade.

Nosso protagonista é Mike Noonan, um escritor de sucesso que perde a esposa de forma repentina. Se já não bastasse o vazio emocional, ele descobre que sua criatividade evaporou junto com ela: bloqueio criativo mais duro que concreto. Sem conseguir escrever uma linha, Mike se exila na casa de veraneio do casal, Sarah Laughs, às margens do enigmático Lago Dark Score. A casa, claro, já começa a dar sinais de que não está vazia — e não estou falando de cupim ou mofo.

O lago tem mais segredos que vilarejo pequeno em novela das seis. Moradores com sorrisos simpáticos demais para quem vive no meio do nada, uma disputa judicial por guarda de criança que cheira a corrupção antiga, e um passado enterrado — não metaforicamente — que insiste em voltar à tona. King conduz tudo como um maestro do desconforto: não joga sustos gratuitos, ele faz você pedir por eles só para acabar com a ansiedade.

Mas o grande triunfo do livro está no equilíbrio. Saco de Ossos não é apenas uma história de fantasmas — é uma história de luto, culpa e obsessões que ultrapassam a morte. O medo aqui não vem apenas do que assombra os corredores da casa, mas do que assombra a mente de Mike. O sobrenatural é importante, mas o emocional é devastador.

E como bom romance de King, a cidadezinha tem mais podridão que prefeitura em ano eleitoral. Racismo velado, poder econômico mandando e desmandando, pactos silenciosos feitos com sorriso cordial. Se existe maldição ali, ela não começou com espíritos — começou com gente viva.

A escrita é envolvente, madura, menos acelerada do que em obras como It ou O Iluminado, mas com um peso atmosférico que faria até Edgar Allan Poe bater palmas. King se dá ao luxo de construir tensão como quem prepara uma fogueira: devagar, com lenha seca e silêncio… até que tudo vira labareda.

Sacode Ossos? Nada disso. Saco de Ossos é daquelas histórias que se agarram na sua espinha e sussurram devagar: “Você não superou nada… só aprendeu a conviver”.

Se o fantasma aparecer no lago… torça para que ele não esteja dentro de você.

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